Nos últimos meses, o tema saída definitiva do Brasil ganhou grande destaque nas redes sociais, em vídeos e até na imprensa, especialmente após recentes declarações do ministro da Fazenda.

Infelizmente, boa parte do conteúdo que circula contém informações incompletas ou equivocadas, o que tem causado confusão e preocupação entre brasileiros residentes no exterior.

A verdade é que não há nenhuma mudança na legislação.
As regras sobre a saída definitiva são antigas e continuam as mesmas.
O que mudou foi o nível de fiscalização e a visibilidade do tema.


Por que o assunto saída definitiva do Brasil voltou a ser falado

Nos últimos anos, a Receita Federal do Brasil passou a ter acesso muito mais amplo a informações financeiras e cadastrais, tanto dentro do país quanto no exterior.

Com base no CPF, é possível cruzar automaticamente dados de bancos, corretoras, cartórios, investimentos e informações compartilhadas por outros países, por meio de acordos internacionais de cooperação e troca automática de dados (padrão OCDE/CRS).

Na prática, isso significa que ficou muito mais fácil identificar situações como:

  • pessoas que deixaram o Brasil há anos, mas nunca formalizaram a saída definitiva;
  • quem mantém contas bancárias de residente, aplicando e movimentando valores normalmente;
  • quem continua constando como residente em cadastros, declarações e movimentações, embora viva e tribute fora do país.

O resultado é que a Receita Federal tem agora maior capacidade de cruzar informações e apontar inconsistências.
Mas é importante reforçar: isso não é uma nova regra — é apenas a aplicação mais eficiente de algo que sempre existiu.


Saída definitiva do Brasil, um tema conhecido para quem acompanha de perto

A saída definitiva do Brasil é um assunto que venho acompanhando e explicando há muitos anos.
Desde 2017, conduzi diversas palestras e transmissões ao vivo sobre tributação internacional, inclusive em eventos nos Consulados do Brasil em Genebra e Zurique e em encontros com a comunidade brasileira na Suíça.

A mensagem sempre foi clara: quem mora definitivamente fora do Brasil deve, na maioria dos casos, formalizar a saída fiscal e ajustar corretamente a situação das contas, investimentos e obrigações mantidos no país.


Procedimentos e regras básicas da saída definitiva do Brasil

Em termos de regularização fiscal, a regra é simples: se você deixa o Brasil em caráter definitivo ou temporário e permanece no exterior por mais de doze meses consecutivos, deve fazer o procedimento de saída — composto por dois passos principais:

  1. Comunicação de Saída Definitiva do País (CSDP);
  2. Declaração de Saída Definitiva do País (DSDP).

A partir daí, você se torna não residente, deixa de ser obrigado a entregar a declaração anual de imposto de renda no Brasil e passa a ter tributação específica como não residente, caso ainda possua fonte de renda no país.


Comunicação de Saída Definitiva do País (CSDP)

A CSDP é uma declaração simples, feita on-line, para informar à Receita Federal a data em que você deixou de ser residente fiscal no Brasil.

O período de entrega vai da data de saída até o último dia útil de fevereiro do ano-calendário subsequente, nos casos de saída em caráter permanente.

Exemplo: saída em 31 de agosto de 2025 → prazo de entrega de 31 de agosto de 2025 a 27 de fevereiro de 2026.

Para quem saiu em caráter temporário, o prazo conta a partir da caracterização da condição de não residente (geralmente após 12 meses de ausência sem retorno ao Brasil) e vai até o último dia de fevereiro do ano-calendário seguinte.

⚠️ Não é possível entregar a CSDP em atraso.

Mais informações estão disponíveis no site da Receita Federal.


Declaração de Saída Definitiva do País (DSDP)

A DSDP é, na prática, a última declaração de imposto de renda da pessoa, informando rendimentos e patrimônio até a data da saída.

Todos os rendimentos e bens são incluídos até essa data (e não até 31 de dezembro, como na declaração tradicional).

O prazo de entrega é de março a maio do ano seguinte à saída definitiva ou à aquisição da condição de não residente.

Exemplo: saída em 31 de agosto de 2025 → a DSDP cobre o período de 1.º de janeiro a 31 de agosto de 2025 e deve ser apresentada entre o início de março e o fim de maio de 2026.

Há possibilidade de entrega em atraso, mediante pagamento de multa, e até mesmo a entrega retroativa de até cinco anos.

Mais informações estão disponíveis no site da Receita Federal.


Saída permanente?

Para fins da Receita Federal, “definitivo” significa permanecer fora do país por 12 meses ou mais, ou sair sem previsão de retorno e completar esse período de ausência.

Muitos me relatam que saíram do Brasil para estudar, trabalhar ou casar e que não sabiam se voltariam; por isso, nunca pensaram que precisariam fazer uma saída definitiva para fins fiscais.

A melhor forma de entender esse ponto é pensar simplesmente em “saída fiscal”.


Nunca declarou antes, passaporte, CPF e outros mitos

Muitas pessoas nunca se enquadraram na obrigatoriedade de declarar imposto de renda enquanto residentes no Brasil e, portanto, não imaginam que esse passo seja necessário para formalizar a saída do país.

Outros acreditam que poderiam perder o passaporte ou ter o CPF cancelado, o que é incorreto.

Esses são mitos comuns.
Não se perde o passaporte, e o CPF não é cancelado quando se faz a saída definitiva.
A nacionalidade é totalmente distinta da condição de residência fiscal.
Após a saída, o CPF permanece ativo, apenas com o status de não residente.

O mundo está cada vez mais interconectado — inclusive na área tributária.
Existem inúmeros acordos de troca de informações entre países, o que representa um movimento global de transparência fiscal.
A realidade atual, especialmente após as falas recentes do ministro, é prova do que venho explicando há mais de oito anos.


Residência e dupla residência

É muito provável que uma pessoa vivendo fora do Brasil tenha se tornado residente fiscal no país onde passou a morar.
Cada país tem suas próprias regras para determinar a residência fiscal — e essas regras não são uniformes.

Aí está o ponto-chave: normalmente, um residente fiscal é tributado com base na renda global.
Na Suíça, por exemplo, é necessário declarar todos os bens, rendimentos, direitos e dívidas, onde quer que estejam, compondo a base de cálculo dos impostos.


Bitributação

Mas e se a pessoa for residente fiscal em dois países ao mesmo tempo?
Pode parecer improvável, mas isso ocorre com frequência.
Quando alguém deixa o Brasil sem realizar corretamente o procedimento de saída definitiva, aos olhos da Receita Federal continua sendo considerado residente fiscal, o que normalmente implica a obrigação de declarar em dois países e tributar a renda mundial em ambos.

Em alguns casos, quando os países têm um acordo para evitar a bitributação, é possível reduzir ou eliminar a dupla tributação.
Mas isso nem sempre acontece, e por isso é indispensável analisar a combinação de países e as regras internas de cada jurisdição, além de compreender como o tratado se aplica à situação pessoal de cada indivíduo.

O Acordo para Evitar a Dupla Tributação entre Brasil e Suíça, por exemplo, passou a produzir efeitos para fatos geradores a partir de 1.º de janeiro de 2022.
Ainda assim, o tratado não elimina automaticamente a bitributação, nem substitui o planejamento fiscal individual.
Cada caso exige análise específica, considerando as normas locais e as particularidades da situação pessoal do contribuinte.


“Dupla personalidade”

Também são comuns os casos de “dupla personalidade fiscal” — pessoas que mantêm bens no Brasil e continuam declarando lá anualmente como residentes, ao mesmo tempo em que vivem e declaram apenas as fontes locais em outro país.

Essa prática cria uma grave inconsistência: em nenhum dos dois países se observam as bases globais de tributação, o que aumenta o risco de descoberta pelas autoridades fiscais, seja por cruzamento de dados, seja por denúncia anônima.

O resultado pode ser investigações complexas e custosas, além de um enorme desgaste emocional e financeiro.


Repatriação

É comum que, ao decidir retornar ao Brasil após anos fora, pessoas que nunca formalizaram a saída definitiva precisem lidar com um processo de regularização.
Muitas vezes, durante o período no exterior, construíram patrimônio ou acumularam recursos sem o devido registro fiscal brasileiro.

Ao regressar, surge a dúvida: como comprovar a origem dos recursos e a evolução patrimonial?
A Receita Federal certamente pode exigir explicações e até cobrar impostos retroativos sobre rendas não declaradas nos últimos anos.

Outro cenário frequente envolve manutenção de recursos ou imóveis no Brasil que se valorizaram ao longo do tempo.
Quando o contribuinte decide transferir esses valores para o exterior, sem ter feito a saída fiscal, enfrenta dificuldades para comprovar a origem dos recursos perante instituições financeiras ou autoridades fiscais estrangeiras.

Por isso, fazer o procedimento correto desde o início evita complicações futuras e permite planejar tanto o retorno quanto a eventual repatriação de forma segura.


Outras considerações

Assim como é essencial realizar corretamente o procedimento de saída fiscal do Brasil, também é fundamental entender o que não deve ser feito depois da saída.

Uma vez que o contribuinte se torna não residente, não deve mais apresentar a declaração anual de imposto de renda como residente.
Caso haja rendimentos de fonte brasileira, eles devem ser tributados de acordo com as regras específicas para não residentes, mediante retenção exclusiva na fonte.

Entregar uma declaração de imposto de renda anual após a saída fiscal é um erro: isso equivale a reafirmar a residência fiscal no Brasil, sujeitando-se novamente à tributação sobre a renda mundial.

Importante também que as pessoas ainda residentes fiscalmente no Brasil observem as obrigatoriedades relativas à Declaração de Capitais Brasileiros no Exterior (DCBE).
Embora essa declaração não envolva pagamento de impostos, sua não entrega ou incorreções podem gerar multas significativas.
As penalidades por falta de entrega ou por outras infrações previstas na legislação variam de R$ 2.500,00 a R$ 250.000,00, podendo ser acrescidas em 50% em determinados casos.

Outro ponto relevante diz respeito aos prazos decadenciais para constituição do crédito tributário.
No Brasil, em regra, a Receita Federal possui o prazo de cinco anos para efetuar lançamentos e cobranças relativas a exercícios não declarados, contado a partir do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o tributo poderia ter sido lançado.
Já na Suíça, o prazo é de até dez anos, conforme as regras locais de prescrição tributária.


E então — é mesmo necessário fazer a saída definitiva? Há novidades em 2025?

Não existe novidade na lei.
O que há é maior cruzamento de informações, mais transparência e mais atenção ao tema.
A saída definitiva continua sendo o procedimento correto e seguro para quem vive no exterior.

O essencial é compreender as regras e decidir de forma informada, considerando as consequências de cada escolha.

Existem casos em que pode fazer sentido não realizar a saída fiscal imediatamente, dependendo do planejamento pessoal e do país de residência — mas isso deve sempre ser analisado com base técnica e individualizada.
Cada caso é único.


Conclusão

Na Thortax, acompanhamos esses processos há mais de 30 anos, com foco em tributação internacional, planejamento fiscal e conformidade entre Brasil, Suíça e Europa.

A experiência mostra que o maior risco não está em fazer a saída definitiva, mas em não fazê-la corretamente — ou em agir sem compreender todas as implicações fiscais envolvidas.

Nosso trabalho é ajudar cada cliente a compreender sua situação de forma ampla, integrando os aspectos tributários, patrimoniais e pessoais, para que as decisões sejam tomadas com segurança e tranquilidade.

Se você deseja revisar sua situação fiscal, organizar a saída definitiva do Brasil ou estruturar sua vida financeira internacional de maneira consistente, entre em contato para agendar uma consulta confidencial e personalizada.


Artigo originalmente publicado em 26/10/2020 e atualizado em outubro de 2025.
Autora: Sandra Thorold-Palmer — Thortax GmbH, Pfäffikon SZ (Suíça).